A Chanel acaba de lançar a Nevold, uma plataforma B2B totalmente independente voltada ao desenvolvimento de materiais circulares em escala industrial. A iniciativa marca uma resposta estratégica à escassez crescente de fibras naturais de alta qualidade e reforça o compromisso da maison com a inovação e a sustentabilidade.
Mais do que uma campanha de marketing ou um relatório de ESG, a Nevold representa o que Bruno Pavlovsky, presidente de moda da Chanel e da Chanel SAS, define como uma “terceira atividade” dentro da estrutura da grife, ao lado das divisões de moda e Métiers d’Art. A ideia é criar um sistema duradouro que permita explorar o potencial dos materiais excedentes ou descartados, em vez de ignorá-los.

Um novo ecossistema circular para além da Chanel
Sob a liderança de Sophie Brocart, ex-CEO da Patou e engenheira de formação, a Nevold foi pensada como uma plataforma aberta e colaborativa. Embora tenha nascido para lidar com os próprios resíduos da Chanel, ela agora atende outras marcas e atua em parceria com empresas como a francesa Filatures du Parc e a Authentic Material. Também colabora com instituições como a Universidade de Cambridge e o Politecnico di Milano.
O núcleo da operação está no L’Atelier des Matières, criado para desmontar produtos no fim de sua vida útil e classificar os materiais. Ao formalizar essa cadeia circular, a Chanel reforça sua atuação nos bastidores da indústria, contribuindo para uma transformação sistêmica sem abrir mão do luxo e da excelência artesanal.
Material reciclado e design atemporal no centro das coleções
A Nevold trabalha diretamente com componentes, e não com produtos acabados, desenvolvendo materiais híbridos que misturam conteúdo reciclado e virgem, mantendo os padrões técnicos exigidos pela moda de luxo. Um dos exemplos mais simbólicos é o tweed, que já vem sendo produzido com fios reciclados em algumas coleções da maison.
Outro caso emblemático é o uso de resíduos de couro no lugar de reforços plásticos em bolsas e sapatos, substituição que já ocorre em até 50% de certas linhas de calçados. Os saltos dos slingbacks icônicos da Chanel, por exemplo, deixaram de ser feitos de plástico e agora utilizam materiais reciclados, alinhando inovação e tradição.

A sustentabilidade como resposta estratégica e cultural
Para Bruno Pavlovsky, a criação da Nevold é uma resposta clara à crise de abastecimento de materiais que ameaça a cadeia de suprimentos global da moda. Segundo ele, cinco matérias-primas representam 80% do volume de produção da Chanel: algodão, lã, caxemira, seda e couro. Todas estão sob pressão devido a fatores como degradação ambiental, instabilidade geopolítica e dificuldade de rastreabilidade.
O objetivo não é substituir os insumos naturais, mas buscar alternativas de longo prazo com transparência total. Como afirma Pavlovsky, “não é sobre a próxima coleção, e sim sobre a próxima geração”. A proposta da Nevold é pensar em soluções estruturais desde agora para garantir que a maison possa continuar criando sonhos no futuro.
Escalabilidade, colaboração e legado: o futuro da moda circular
Diferente de programas focados apenas em revenda ou upcycling de produtos prontos, a Nevold atua no início da cadeia, onde a transformação pode gerar mais impacto e escala. Ao abrir a plataforma para outras marcas e parceiros, a Chanel reconhece que, sozinha, não conseguiria alcançar a escala necessária para viabilizar a circularidade em toda a indústria.
A iniciativa surge em um momento de mudança para o setor de luxo, com menor demanda em mercados como a China e pressão crescente por parte de consumidores jovens. Ainda assim, Pavlovsky deixa claro que a missão da Chanel permanece a mesma: alimentar o desejo. A Nevold não é um projeto para gerar ROI imediato, mas sim conhecimento, resiliência e capacidade de adaptação.
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Circularidade sem comprometer o sonho criativo da Chanel
Apesar do avanço em materiais reciclados, a Chanel não estabelecerá metas rígidas sobre a porcentagem de conteúdo reciclado em suas coleções. Para a maison, o foco continua sendo o legado criativo, e não a imposição de métricas que possam comprometer sua identidade. O que importa, segundo Pavlovsky, é estar preparado para o que está por vir.
“Na Chanel, o obrigatório é criar um sonho. A Nevold nos permite continuar fazendo isso”, afirma. O lançamento mostra que é possível manter a tradição e, ao mesmo tempo, construir o futuro da moda com responsabilidade, colaboração e inovação.
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